quarta-feira, 18 de junho de 2014

DIÁRIO DE COPA: Capítulo 4 - Massacre Alemão

Camisa de Reus para homenagear o craque, que foi cortado do mundial após lesão
 

O relógio marcava 6h50 quando o sol já batia forte na janela do quarto. Salvador amanhece incrivelmente cedo, e sempre acordo pensando já ser umas 10h. A ansiedade tomava conta. Comecei a me arrumar às 8h, com medo de chegar atrasada, não podia perder um momento sequer. O jogo começava 13h.

Se no fim de semana a cidade já fervia de ansiedade e de estrangeiros chegando por todos os lados, na segunda-feira a festa apenas se consolidou. Alemães desfilavam a todo o momento pelos pontos turísticos da cidade, sempre muito sorridentes e confiantes. Os ‘portugueses’ mais eram brasileiros entusiastas e fãs de Cristiano Ronaldo, que pareciam prever o que estava por vir, e por isso faziam uma festa mais discreta. 

Decidimos ir para o jogo de ônibus, eu, Fred e o colega carioca Filipe, ambos trajados na torcida alemã. Fui de Borussia Dortmund, enquanto o namorado foi de Bayern de Munique, rivais até nessas horas. Nosso ônibus partiu rumo a Arena Fonte Nova às 11h15, e a partir daí, um caos se pairou. O prefeito de Salvador não decretou feriado para os dias de jogos aqui, tornando o trânsito um inferno até a chegada ao estádio. Nosso ônibus passou mais tempo parado que andando. O caminho que podia ser facilmente feito em 20 minutos, se tornou uma cansativa viagem de 50 minutos. Nessas horas minha gastrite já tinha superado todos os limites possíveis.


A chegada ao estádio


Arena Fonte Nova recebeu mais de 51 mil pessoas




Após um longo trânsito, enfim, era possível visualizar o estádio, só então fiquei mais aliviada. Ainda faltavam cerca de 40 minutos pro início do jogo. Festa e mais festa, e multidões calorosas iam se espremendo pelas entradas. Até chegarmos ao nosso local, tudo ocorreu de forma tranqüila. As centenas de voluntários gritavam e guiavam os torcedores até as diversas entradas da arena. O maior problema era a falta de instrução dos mesmos para com os gringos. Era nítido que a maioria ali não sabia falar sequer inglês básico, o que tornou comum a cena de estrangeiros perdidos pedindo informação a qualquer um que vissem. 

Dentro do estádio, o ‘jeitinho brasileiro’ não podia faltar. Torcedores que compraram ingressos da categoria 4 (a mais barata, de R$ 60) deviam sentar em seus lugares, atrás dos gols. Mas é claro que não era isso que se via. Uma cena se tornou comum: penetras circulavam pelas melhores categorias, aquelas de lateral do campo (categoria 1 e 2), procurando por cadeiras vazias para se apoderarem. Os estrangeiros têm costume de entrar no estádio apenas cinco minutos antes da partida e olhe lá, então quando eram 12h55 muitos começaram a chegar e expulsar os intrusos de seus lugares. 

Minha visão do campo, logo atrás do banco de reserva alemão
 
Antes mesmo do jogo começar eu já filmava e tirava foto de tudo que via pela frente, encantada e ainda sem acreditar que vivenciava tudo aquilo. Logo a poucos metros do excelente lugar que fiquei (logo atrás dos bancos de reserva), eu admirava de perto Schweinsteiger, Klose e Groskreutz aquecendo na beira do gramado. O melhor jogador do mundo, Cristiano Ronaldo, também desfilava a poucos metros de mim. 

A primeira ministra alemã Angela Merkel acompanhava tudo dos camarotes. O curioso era o comportamento dos torcedores quando a viram chegando às tribunas. Em uma fase onde chefes de estado são vaiados pelos brasileiros nos estádios, Merkel teve toda a atenção dos torcedores, que se viraram de costas para o campo e tiraram fotos animados da chanceler alemã.

Groskreutz, Schweinsteiger e Klose no aquecimento

Jogadores batem bola no gramado antes da partida começar


O jogo


Durante toda a partida, um massacre alemão. O técnico Joaquim Löw não pode contar com Schweinsteiger, ainda recuperando de lesão, e optou por Khedira. Se esperava que a seleção tivesse algumas dificuldades defensivas, mas o que se via em campo era um massacre por parte dos germânicos. Müller foi postado como falso 9, enquanto Klose assistia tudo do banco. Se para o veterano o objetivo é superar a marca de Ronaldo e se tornar o maior artilheiro das Copas (faltam dois gols).

Pênalti para a Alemanha. A porteira seria aberta por Müller em instantes

Müller então começava a desenhar mais um capítulo de sua excelente história na seleção. Foram 3 gols do até então artilheiro da Copa. Após o fim da partida, o jovem atacante de 24 anos já somava 8 gols em 7 jogos de Copa do Mundo.  Se Ronaldo se preocupa a todo momento com a marca a ser batida por Klose, é bom que ele comece a se preocupar com Thomas, que tem tudo para, mais uma vez, brilhar no mundial.

Já pelo lado português, Cristiano Ronaldo terminou a partida se arrastando, exausto por precisar comandar uma fraca seleção que depende totalmente de si. Apesar de boas referências como Pepe e Coentrão, que jogam ao lado do craque no Real Madrid, os portugueses pouco sustos levaram ao goleiro Manuel Neuer. A imprudente expulsão de Pepe tornou ainda pior o pesadelo de estréia dos lusitanos. 

Festa da torcida alemã. Bandeiras tomaram a Arena Fonte Nova



Os torcedores alemães não se continham sentados. A maior parte deles permanecia sempre em pé, o que me fez trocar de lugar no segundo tempo. Fui para o lado oposto onde eu estava, só para ficar no meio de uma torcida organizada que entoava gritos em alemão durante toda a partida. Os voluntários até tentavam conter a multidão e pedir que ficassem sentados, mas aqui entrava mais uma vez a falta de instrução para os mesmos, que pediam que os torcedores sentassem, em português! Todos, é claro, ignoravam as ordens e permaneciam pulando e cantando durante toda a partida, um protesto ao futebol moderno. Até porque, assistir jogo sentado é agonizante. Estamos em um estádio de futebol, e não no teatro. 



Com o 4x0 liquidada, resta à torcida festejar nas arquibancadas. Os alemães pulavam, cantavam e derramavam cerveja em quem passasse perto. Uma sensacional aula de patriotismo e festa nas arquibancadas. Enquanto os brasileiros tentavam puxar o insosso grito de “Eu sou brasileiro, com muito orgulho...” os alemães se divertiam com suas músicas confusas e gritos de guerra modernos. O único jogador a ter o nome gritado foi Podolki. “Lu lu lu, Lukas Podolski” gritava a torcida, quando o atacante entrou no segundo tempo. É nítido o respeito que o atacante do Arsenal tem por todos os alemães, mesmo não sendo mais titular da equipe.



Festa pós-partida

Se o jogo todo foi uma grande festa, o pós não poderia ser diferente. Embalados e sorridentes, os alemães se misturavam na saída a uma grande quantidade de torcedores do Bahia, que entoavam seus gritos provocativos ao rival Vitória. Se o clube baiano já havia conquistado Neuer e Schweinsteiger, foi no estádio que tiveram ainda mais visibilidade. Pude avistar uma nova febre entre os baianos, que usavam camisas com o nome    “Bahia de Munique”.

Alemanha x Portugal. Um jogo que jamais esquecerei

O que se pode ver é que a Alemanha deixou sua marca registrada para sempre no coração dos baianos, e também dos brasileiros. Se antes era conhecida como uma seleção fria e séria, hoje é vista como uma das mais carismáticas da Copa, e tem tudo pra chegar longe, mesmo sem sua principal estrela. Reus também era muito lembrado e teve o nome gritado nas arquibancadas, assim como visto em diversas camisas. 

Em um dia que começou com o despertar de Michael Schumacher, em coma por mais de 6 meses, a Alemanha provou que não veio ao Brasil para brincadeira, e que levará a sério a garra e vontade de conquistar o tetra. Não falta motivação para os jovens e experientes atletas, e a partir desta Copa, também não faltará torcida e incentivo. O Brasil abraçou a Alemanha.  

domingo, 15 de junho de 2014

DIÁRIO DE COPA: Capítulo 3 - Clima de carnaval

As protagonistas da vez: Alemanha e Portugal dominam Salvador

Fim de semana em clima de carnaval em Salvador. As ruas que antes eram tomadas por uma invasão laranja dos torcedores da Holanda, dão lugar agora aos polacos alemães. Aos montes, os germânicos vão chegando e invadindo a capital baiana. A seleção que vem conquistando cada vez mais fãs durante o mundial terá que superar a grande perda do meia Marco Reus, que tinha tudo pra ser um dos maiores destaques dessa Copa. Ao menos uma boa notícia, o goleiro Manoel Neuer e o meia Bastian Schweinsteiger devem jogar e não são mais grandes problemas para o técnico Joaquim Löw.

A seleção alemã fez toda sua preparação para a Copa em Porto Seguro, interior da Bahia. Os alemães desembarcaram ontem a noite na capital baiana, e hoje cedo já fizeram reconhecimento do gramado na Arena Fonte Nova, onde jogam amanhã, às 13h, contra Portugal.

Antes disso, minha tarde de sábado foi reservada para assistir a estreia da querida Colômbia, seleção que trouxe ao Brasil uma das maiores torcidas da competição. Como já foi dito aqui no blog, os colombianos foram outros que invadiram o Brasil – mais de 70% do estádio do Mineirão foi tomado por eles. Em campo, a Colômbia conseguiu suprir a falta de Falcao Garcia contra a fraca seleção grega. Os destaques do time tem nome: James Rodriguez, jovem promessa de 22 anos, que se destacou jogando pelo Porto, e hoje atua pelo Monaco. Além dele, o meia Cuadrado, de 26 anos, da Fiorentina, é outro que chama atenção na seleção colombiana. O meia tem sido sondado pelo poderoso Barcelona. 

Qualquer beco com televisão era invadido por multidões sedentas por Copa!

O grande jogo do dia viria mais tarde. Os bares de Salvador começaram a encher logo no fim da tarde, quando estrangeiros se amontoavam para assistir Itália x Inglaterra. Os bairros boêmios da cidade recebiam gente de todos os tipos. Fui para a área do Farol da Barra, ponto turístico bastante conhecido da capital baiana, que atraiu turistas de todos os lugares.  O vídeo abaixo mostra momentos de festa durante o jogo entre Itália x Inglaterra, nos bares da Barra:

 

Antes mesmo do relógio apontar 19h e o início do jogo, não era mais possível encontrar lugares vazios nos bares e restaurantes da região. As pessoas passaram a acompanhar os jogos em pé e do lado de fora dos estabelecimentos, sem se importar de beber uma cerveja no meio da rua. O clima de carnaval e diversão era grande tanto entre brasileiros quanto para estrangeiros, que nunca se sentiram tão a vontade em um país antes.

Na tarde deste domingo fui a um bar do centro para assistir França x Honduras. Minha curiosidade pela seleção francesa só cresce a cada jogo. Os franceses, que antes era desconfiança para o mundial, vem fazendo os melhores jogos entre as seleções europeias. O destaque do dia ficou por conta de Benzema, que marcou dois gols e participou de mais um (contra). Estarei presente no jogo contra a Suiça no próximo dia 20 aqui na cidade. Espero ver a boa seleção rendendo mais uma vez.

Ainda no bar, foram chegando aos poucos diversos torcedores argentinos, prontos para acompanhar a partida de mais tarde contra a Bósnia. Sem vergonha de demonstrarem sua paixão por onde passam, os argentinos não parecem intimidados pelos brasileiros, e têm feito uma das festas mais bonitas desse mundial. 

Ingressos para a partida de segunda (16). Ansiedade toma conta

Acho que ainda não acredito que estarei no estádio amanhã para ver um jogo da Alemanha em uma Copa do Mundo! E ainda contra a equipe de Cristiano Ronaldo. Será um longo e inesquecível dia para mim. Que seja inesquecível também para a Alemanha. Comprei até tinta guache preta, amarela e vermelha para pintar o rosto.

Blühe, deutsches vaterland!

sábado, 14 de junho de 2014

DIÁRIO DE COPA: Capítulo 2 – De Foz do Iguaçu a Salvador

 A invasão colombiana em Foz

Pai e filho animados com a seleção colombiana

Logo ao chegar no aeroporto de Foz do Iguaçu, me deparo com uma divertida surpresa. Dezenas de torcedores colombianos desfilavam alegrementes pelo saguão do local. Trajados da cabeça aos pés, homens, crianças, mulheres e idosos devidamente uniformizados com a camisa amarelinha. 

Desânimo pela ausência de Falcao Garcia? Nada disso, os rostos estampavam confiança. “É muito triste ficarmos sem Falcao, mas não podemos desanimar. Há anos não vemos uma seleção tão competitiva e talentosa” dizia um senhor que aparentava ter lá pelos seus 60 anos, esbanjando carisma e ansioso para viajar, ao lado de um amigo equatoriano, que viajava para Brasília.

Simpatia não faltava entre os torcedores estrangeiros

Os diversos colombianos se preparavam para embarcar rumo a Belo Horizonte, onde a seleção estreia amanhã contra a Grécia, pelo grupo C. A seleção ainda enfrenta a Costa do Marfim e o Japão, em um grupo equilibrado, e mesmo sem Falcao Garcia deve se classificar para a fase seguinte com certa facilidade.


Escala em Curitiba: pausa para ver o massacre holandês

Apesar do medo de viajar em meio a Copa do Mundo já em andamento, a viagem foi bastante tranqüila. Chegando a Curitiba em horário pontual (até antes do previsto), desembarquei e fui correndo para a sala de embarque, onde todo mundo olhava para a mesma direção: uma televisão onde assistiam sem piscar o jogão entre Espanha x Holanda. Assim que me sentei, golaço de Robin Van Persie, que naquele momento ainda empatava o jogo em 1x1. 

Um pouco antes de embarcar a Holanda já calava os espanhóis com uma sova de futebol bem jogado: 3x1. O tempo do meu embarque até o momento em que sentei confortável em minha poltrona foi o bastante para confirmar o que todos no avião comentavam surpresos: a Holanda goleava sem dó a atual campeã mundial. 4x1.

Aeroporto parado para ver o massacre holandês

Antes do meu vôo decolar às 17h55 pontualmente, ainda deu tempo de acompanhar o fim do jogo pelas redes sociais. 5x1 fora o baile, de uma Holanda que chegou com dúvidas e até mesmo ameaçada pelo Chile ao posto do segundo lugar do grupo B. Se a dúvida até o momento era se os chilenos ou holandeses classificavam, a história agora muda. Estaria a Espanha ameaçada? Após esse jogo, resta rezarmos para que a Holanda fique mesmo em primeiro no grupo, afinal, cruzar com eles novamente nas oitavas seria uma dor de cabeça sem tamanho para a seleção brasileira. 

Meu vôo para Salvador é um “pinga-pinga” até Manaus. Ele fará escala em Salvador e Fortaleza antes de chegar à capital amazonense. Graças a isso foi possível encontrar torcedores de diversas seleções. O converseiro era recheado de uma deliciosa mistura de sotaques e línguas, a maioria discutindo o óbvio: futebol.

 Uruguaios rumo ao Ceará, para assistirem a partida contra a Costa Rica. Ingleses e italianos indo para Manaus, onde acompanham o grande jogo entre as duas seleções.  Alemães e portugueses desembarcando em Salvador, para o jogão da próxima segunda-feira. E brasileiros é claro! A Copa do Mundo é isso, uma infinita mistura de culturas em prol do mesmo ideal, vivenciar futebol 24 horas por dia. Se existe coisa melhor, eu não conheço!


Chegada em Salvador: Enfim, respiremos Copa do Mundo!

Eram 20h20 quando o avião pousou em solo baiano. Incrivelmente a viagem para Salvador parece sempre infinita, ainda mais dessa vez, vindo de Curitiba. Apesar da demora normal do vôo, foi tudo muito tranquilo. Logo que desembarquei já era possível avistar várias camisas laranjas pelo saguão do aeroporto. A seleção holandesa passaria por ali em alguns minutos, embarcando direto para o Rio de Janeiro após a goleada. Por onde eu olhava, era possível reconhecer muitas camisas de Alemanha x Portugal, confronto que acontece segunda-feira (16).

Salvador respira futebol. Esse é o clima das cidades sedes da Copa do Mundo, que recebem milhares de turistas, que pouco se preocupam com obras inacabadas ou alguma desordem pelo caminho. Eles pensam mesmo é em festejar, disseminar sua cultura e alegrar por onde passam. Foi assim que os holandeses dominaram Salvador na tarde de sexta-feira. 

 
Holandeses pintaram Salvador de laranja (Foto: Divulgação)

Uns chegam, outros vão. A tendência agora é vermos uma Salvador recheada de polacos animados carregando suas famosas cervejas por onde passam. Os alemães não são mais vistos como “cintura dura” como eram reconhecidos em muitas Copas passadas. A seleção germânica é hoje uma das mais carismáticas em solo brasileiro, e arrancam simpatia de todos os brasileiros. 

A minha luta por um ingresso continua. Tenho até às 15h de segunda-feira para conseguir entrar na Arena Fonte Nova e realizar o meu sonho de assistir os meus preferidos. Até lá, continuo acompanhando tudo por aqui. Salvador amanheceu com um sol forte que a muitos dias não se via, e o dia será longo.